sexta-feira, 1 de maio de 2015

dos dinossauros...

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"e por vezes as noites duram meses
e por vezes os meses oceanos
e por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos 
e por vezes
encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
e por vezes fingimos que lembramos
e por vezes lembramos 
que por vezes
ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos
e por vezes sorrimos ou choramos
e por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos"

David Mourão-Ferreira, “Matura Idade, 1973.”
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eu dinossauro - naej pala & fernando schubach










































eu dinossauro
devoro arte
e o medo 
e o mito
que me invade 
da palavra
me engulo
me ocupo 
dos lugares
me desencontro 
me perco
às cegas
me pare
me espere
da angústia 
me iguale
me dispa
me responda
se até onde 
vou
vale
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eu fui cortado em pedaços grosseiros
fatiado nas
pegadas do cão
e outras obscenidades 
incomunicáveis
as facas golpeando
e ninguém apareceu 
nem deus
aqui e agora eu estava escapando da lâmina
mas não deu
na dificuldade de escapar dos acentos
as vírgulas me pegaram
fui assaltado
rasgado
e violentado
sem ter culpa de nada
essa vida me rasga 
em cada ponto final
e eu vou fazer o que?
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e que mal há 
em ficar-se
deitado
na tarde
quieto
num dia primeiro
de maio
meu trabalho
é o deslumbramento
estou tentando
desligar
o relógio
do acaso do tempo
entre as coisas 
confusas 
quero que me esqueçam 
agora 
lá fora
ou dentro
o medo
o escuro
a falta de letra
a causa
o efeito
o poema perdido
o lugar cansado
meu lugar nem nunca
foi no passado 
mas às vezes é difícil 
entender 
que tudo é uma questão 
de vento
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a gente
vira 
fênix 
quando não tem
pra onde
ir
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indicando
o inverso
do amanhã











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...sofreu o cão que o diabo amassou 

— com Magda Isabel Nascimento.
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com os meus olhos de personagem
passei hoje por um abraço 
que ficou 
preso aqui
a melhor cadeia
dos abraços 
é a lembrança
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a felicidade é um estado de foda-se
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inquilino
é tudo aquilo
que não assino

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eu engulo
angústia 
feito dinossauro
e as coisas 
que não 
consigo digerir
eu cuspo

— com Fernando Schubach
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tem um grito aí sobrando
para me emprestar?
meus gritos são verões 
eu de garganta inverno
invoco outonos
e a chuvarada
que me aguarde
na próxima primavera

— com Fernando Schubach em Instituto Tomie Ohtake
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...vezes que 
preparo as coisas
como se elas nunca
fossem acontecer
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ainda não consegui
essa coisa isolada 
ainda não consegui
essa coisa de único 
quando a arte é tanta que
extravasa 
a arte pelos poros
únicos 
eu tenho lido
eu tenho livros
e me entendo
único 
deveras arte
ensino pouco
domaisqueaprendo
eu sei quando faço 
aconteço
breve
ali quando faço 
poesia
quando como faço 
as coisas do meu jeito
o jeito certo 
que não é o erro
o jeito
que a poesia me cabe
sempre cabe perfeitamente
até onde a raiva me comove 
ou consome
e eu faço o que eu sinto
e sinto muito
muitíssimo 
por todos que não entendem
que o que faço 
não passa em branco
nem passa em nuvens 
ou elogios
o que eu faço 
do jeito que faço 
não é sempre o certo
mas o meu preço 
eu pago
e prego:
mesmo errado
do meu jeito
sempre acerto
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nas torres do desejo permanente
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contar não mata

saudade
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meia laranja
meio amargo
meio seco
meio árido
meio
um meio de se livrar
meio azedo
meio ácido
meio básico
meio químico
meio físico
todo sarcástico
meio começo
meio a meio
fim
do fio
meio fio
todo
cortado
metade
doce
metade
sim
metade 
boa
metade
ruim
os intrometidos
não
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toda comédia deriva do medo
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sem tom 
nem som
cortada
voz
oculto
em meu nome
cego
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eu
árvore
por dentro
um ramo 
de loucura
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