quinta-feira, 31 de março de 2016

dos descompassos...

.
"cultivar amizades
como quem planta cebolas
o choro
ao cortá-las"

R. Ponts (Rodrigo Pontoglio)
.
Colagem de Fiona Watson



































estou na biblioteca
e vai chover
queria poemas
e palavras
e não água
......................................................

minha asa quebrada
significa
ausência
......................................................

poderia ser pleno
e no entanto
tenho tido
o mínimo
então decreto
que o mundo
não merece
sentir mais nenhum passo meu
e que nem mais eu
tenha que
cair
......................................................

tudo o que é
refere-se a
alguma verdade
extinta
......................................................

baseado em fardos reais
e nos mínimos trajetos
cada vez mais
difíceis
o difícil não é ter-se
é saber-se no outro
quando a dor
vibra em
mínimas
notas
......................................................

olhar
como quem nunca viu
só para enxergar
além dos olhos
perceber que cada gota
já é chuva
ou travessia
de lago
ou lágrima
......................................................

um céu para poucos
amantes
desossados
desencarnados
atingidos
por um bisturi
preciso
assinalado
direto
(e sem flecha alguma)
muitas e muitas vezes
dolorido
pontiagudo
ácido
fazendo um só dia
valer por uma vida
inteira
......................................................

toda
felicidade
tem
frente
e
verso
......................................................

adultero
as fotos
das janelas
do viaduto
do alto
as janelas
são entradas
de luz
e de ideias
mais
claras
..........

terça-feira, 29 de março de 2016

dos espécimes...

.
"mas é vida esse sono perdido
dentro de mim o rosto
à espera da mão 
que adormecerá meu sonho."

Carol de Bonis (adaptado)
.
Foto de Rick Barneschi










































espécies
                 para Ilza Tavares Viana

folhas molhadas na cabeça
cheiro depois de chuva
braços longos
alcançando
granizo
tento respirar futuro
buscar inspiração
preciso de combustível
em letras e olhos:
enquanto o agora
se esvai,
espero
........................................................

observações 
e opinimilhões
de coisas 
a serem
desconsideradas
.....................


segunda-feira, 28 de março de 2016

das permanências...

.
"por ser amor
permaneço
construo sobre a luz
e um bocado dos meus dias
constrói comigo"
Adônis
.



























amor et tussis non celantur

o acesso às coisas
ou o acaso
não fazem a mínima diferença
para o amor
ele ignora
certas tendências
abusivas
de falar demais
ou acontecer
demais
o amor
é instante
incompreensível
ou se vive
ou se morre
dele
constantemente
........................................................

já cavalguei 
pelo espaço 
dirigi cavalos marinhos
naveguei pelos quatro 
cantos de Andrômeda 
e pelos sete mares revoltos
com as mochilas 
a jato de extraterrestres
e barcos a vela de fogo
nesse planeta 
presente
é só fazer adaptações 
devidas pra montar nesses caixotes 
metálicos 
elétricos 
que os terráqueos 
chamam de
automóvel

........................................................


raiz

o corpo em convulsão 
num abraço 
um risco de vidas
cruzadas há tempos
escuto por dentro
a falência de memórias 
futuras 
mas o presente me deixou
um contraste
cores entre selva 
e cidade
as cores podem até 
algum dia
não serem as mesmas 
mas distância,
tempo 
até mesmo morte
não podem
romper
esse
vórtice 
entre
nós
..................

domingo, 27 de março de 2016

das lapidações...

.
"aprendi 
que tanto o amor 
como a verdade 
têm uma estrutura de ficção:
quando se ama
um outro é inventado
e continua-se a reinventar 
esse outro 
quando o amor 
se estende 
no tempo."

Julio Carvalho (adaptado de Fernando Oriente)
.



























poesia do amante
quase pronto
sempre apto a ser lapidado
ou por desacerto
ou por encanto
........................................................

eu não sou o que digo
mas é como se fosse
verdade
num ato de deslocamento
entre o instante e o antigo
........................................................

uma multidão 
me atravessa
a cabeça
........................................................

ressurreição

o amor efeito
de um
é feito
de coisas 
mórbidas:
suor do peito
ficar sem jeito
e a dor no leito
de quem não 
goza
amor é feito
um monte de restos
indigestos
que se não dispostos
direito
nunca 
ficam
certos
.............

sexta-feira, 25 de março de 2016

dos absolutos...


















"(H)á-mar agitado
(H)á-mar calmo
(H)á-mar imenso
(H)á-mar intenso
(H)á-mar(é)
(H)á-mar(é) simples
(H)á-mar(é) complexo
Há mar
Amar
Amar é
A Maré."

aMarécomplexo - Vanessa Américo











a sexta feira e suas paixões

cheguei em casa. todo molhado. peguei a maior chuva. 
lavei a alma. a chuva é essa coisa sem nome água 
que cai do céu sem nenhuma previsão absoluta. 
todas as coisas são assim. caem sem previsão absoluta. 
a chuva não me mete medo porque seca depois no chão. 
as outras coisas inesperadas não.
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existe o silêncio 
das coisas 
que não falam
do eco das cavernas 
e das casas em construção 
existe o silêncio 
das manhãs 
de feriado
e das dores de mandíbulas 
caladas
existe um silêncio pior
o dos que nunca dizem
nada

existe o silêncio 
das coisas presas
entre os dentes
..............................................................

proibido

o vermelho
é seu lugar
escondido
..............................................................

porque eu leio
as coisas curtas
e as maiores 
me cansam os olhos
porque assim
me parecem 
certas vidas:
quanto
maiores 
mais 
cansadas
..............................................................

dias estranhos 
esses feriados 
que se aproximam
das janelas
e as pessoas não 
fazem
nada
dizem os dias inúteis 
mas são mais
úteis 
para a alma
do que outros 
dias de parar
e pensar o luto
das horas mortas
dos dias
úteis
..............................................................

noite na cidade
um foco
um farol
de milha
um carro
por dentro
a milhões 
de cavalos
por hora
chega
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produto
poesia



























quando porém
vier o que é perfeito
o que é imperfeito
desaparecerá

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domingo, 20 de março de 2016

das desconstruções...

.
"é difícil
quase sempre...
mas não quero trabalhar
com minhas limitações
e sim com minhas 
possibilidades"





.


eu 
magma
desconstruído
à míngua do caminho
vou por onde não preciso de portas:
lava
leva fogo
e água
até enxurrada
queima
se não se 
espera
nada
até secar a última gota
de
medo
onde
eu
paro
............................................................


a cada acorde 
de um político 
eu acordo 
pior
vamos tocar
outro
instrumento?
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elementares
parlamentares
e políticos 
me sinto
invadido
e nem uso mais
bandeira nenhuma
meu mastro é a palavra
meu caco
de vidro
minha bandeira
amigo
é sobreviver
como tantos
que tem
muito 
sofrido
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ato público

responda
senão 
faço intriga
de você contra o mundo 
e mando o mundo cão 
te roer até os ossos
te doer até a alma
acabar com sua calma
tirar seu sono
te colocar medo
manipular sem nenhum 
respeito
porque assim me fazem
e assim não quero feito
então responda 
antes que o mundo 
vire
uma
bomba
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quero colorido
onde me tiraram 
as cores
quero verdades 
onde me deram
mentiras
quero soluções 
e não palavrões
quero a vida como ela é 
com sentido
justa

simples
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o fundo 
do posso 
é um poço 
sem fundo
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não volte para o mundo onde você não existe
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de alma lavada
só não ensaboei as partes 
que me traziam
lembranças
suas

(adaptado de Gri Lo)
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terça-feira, 15 de março de 2016

das direções...

.
"Há entre o coração e a pele 
cumplicidades para cujo entendimento 
apenas corpos como o dele às vezes contribuem.
Olhando-o nos olhos não é fácil destrinçar 
do alcantilado coração a cama onde dormíamos, 
ao mais pequeno sopro o sol parece evaporar-se.
Por esse coração, ainda que escarpado, 
era, no entanto, fácil alcançar a pele, 
o mar à força de bater na rocha 
ia ficando a pouco e pouco em carne viva."

Luís Miguel Nava. "A pouco e pouco". 
In:_____. "Como alguém disse". 

.

.
‪#‎dialogos

na medida do impossível
passam as dores de cabeça
quando não se falam
por palavras intensas
o possível
acontece
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‪#‎dialogos

iguais as suas fotos
que não falam 
mas cantam pelos 
seus olhos
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‪#‎dialogos‬

procure a alma
sem a calma
porque hiperativos 
não sabem o q é calma
mas a alma sim
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na poesia
nada se explica
tudo se
transporta
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dia de poesia lá fora
e tem
gente que olha
pela janela
espia o outro 
dia
esperando 
poesia
porque a vida
em cada quarto
anda isolada
e as coisas de fora 
acabam
descartadas
esquecem
que poesia
é o que se joga 
fora
são as palavras esquecidas
que mesmo
apagadas
se bem cuidadas 
aquecem
o
coração
das pessoas
solitárias 
e dos poetas
abandonados
a poesia é o cuidado 
com o resto das coisas
atiradas
do outro lado 
da janela
de todos os quartos
casas
redemoinhos
enxurradas
bolas de papel 
e rascunhos:
a poesia é a distração
com nada
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blasé sendo cult...

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além disso
pensar traz muita pedra 
e pouco caminho
por isso eu
poeta
um reformado de letras
o que me resta fazer? 
dispensado de letrar 
me dispenso de pensar
aprendi nos muitos anos de letras: o tempo anda por palavras
a gente tem é que ficar levezinho 
e sempre apanhar boleia 
numa dessas poesias da vida
por exemplo:
qual é a palavra para dizer futuro? 
assim
como se diz futuro? 
não se diz
na língua deste lugar de poesia assim
porque futuro 
é uma coisa que existindo 
nunca chega a haver 
então eu me satisfaço 
do atual presente
e só 
por isso até esqueço as coisas
mas só pela parte de dentro 
a parte de fora
guarda na memória da pele 
de cor
e assaltado
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waves

me amam braços
que atrapalham
nasci e nasceu comigo
esse poema
capaz de me desvencilhar 
desses braços
o que sinto sobre isso
reina na terra
dos segredos
tenho um rosto
voltado para a lua
e gosto pelas marés
vim ao mundo
e em meu caminho
eram ondas
e abraços
que aprendi a cruzar
feito fagulhas
fogo que respira nos pulmões
e eu louco
sou fera que avança
levando um flor
buscando um abraço
tecido com fios de chuva
assim quando eu me entregar
me afogarei
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