terça-feira, 7 de junho de 2016

dos temores...

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"eu poderia
escrever sobre tantas coisas, 
mas é sempre uma corrida contra o tempo 
e tantos os pormenores envolvidos...
é música que acaba, é o farol que abre, 
é a #nãopostada, é a mensagem que chega, 
é um “oi”, é o sorriso espontâneo, é o "tô indo", 
é a hora que voa, é o “espera, vamos tomar mais um café”, 
é o café que esfria, é o telefone que toca, é a hora que perdemos, 
é um “a gente vai se falando”, 
é o abraço apertado de quem não quer se despedir, 
é a dor de quem decide ir mesmo querendo ficar, 
é a música que começa, é uma memória musical, 
é uma saudade, é uma vida inteira acontecendo 
em fragmentos de cotidiano..."

Renata Forné
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corações
artificiais
não me
(a) traem
mais

nada prático
um coração
estático

corações
artificiais
me limitam
demais
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contra
tempo

o
acaso
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51 anos

adeus momento
agradou-me muito
porque foi lento
e quando se foi
quando virei a cabeça
ainda te vi um pouco mais
agora que caminho
recordo que foi pouco
escapado
com uma leve névoa exterior
e um poderoso ar de melancolia
o que não sei bem
é o que existia
dentro
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peripécias
do não:
não posso
não devo
não quero
não sim
to
não
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"entre as coisas e mim
a vontade aferrada ao
pensamento afirma o possível.
não quero deuses aqui
entre o seu corpo e o meu
quero o percurso natural
do abraço
quero apenas isso
o ar da sua voz na minha voz
tormenta e repouso
e nosso riso que brinca"

AR - Luis O. Tedesco
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no sonho
a liberdade voa
com
mais
asas
entro no meu sonho
sem licença
liberdade
desavergonhada
ela sabe que o futuro
é só matéria de fantasia
fatiava o silêncio do quarto
brotando pelas janelas
suspeitava de
suas respostas:
no sonho
tudo é uma verdade
indecifrável
trouxe com ela o vento
a nuvem
a chuva
e veio o rio junto
até o mar
- maior liberdade
de todas
filha do sono
e neta do sono
a liberdade no sonho
e eu sem querer acordar
busquei me proteger
debaixo de suas asas
mas as águas correntes
da liberdade
nunca prendem
mesmo assim é preciso
se aninhar na liberdade
para ganhar coragem
e voar
com medo de perdê-la
prendi a respiração
para não sufocar
tanta leveza
um medo morno
suspirou em mim
medo dela decifrar
outros meus desejos
desfazer meus novelos
desamarrar meus nós
sem aviso
eu sempre me escondo
atrás das minhas redes
voltei a dormir para sonhar
tenho menos medo
de ser livre quando sonho
no sonho
no meio do mar
era sombra
perfume
e tesouro
então joguei
minha suspeita de tanto medo
para o nada
e quanto mais adentrava
o sonho em mim
mais se misturava:
o mar virou espuma
amparando o meu medo
quando acordei
não desconfiei
ser amor
que meu coração
pulsava
e meu cuidado dobrou
com tanto amor
se manifestando
até a ponta dos meus dedos.
antes
no sonho
meu corpo era todo amor
e quanto mais eu amava
mais liberdade eu sentia
adentrava o sonho
acordado
e descobri que o amor
tem suas invenções
no meu silêncio
eu escutava o coração
com sentimento
só em definitivo silêncio
se ouve o amor cantar
a liberdade responde
como um navegante
sem se afogar
o amor tem seus mudos
sofrimentos
voltei a sonhar segredos
nos meus sonhos
sem dizer palavra
se dizer no sonho
o amor desaparece
e fica guardado só em lembrança
mastiguei o silêncio
e percebi que isso demandava
mais amor
mais sombra
mais sonhos
mais perfume
e mais tesouros
e muito mais mar para navegar
amor dá medo até em sonho
mas ao mesmo tempo
amar em sonho
é adivinhar o que ele permite
em desmedida liberdade
viver no sonho do outro
é sentir-se amado
- como o amor é egoista -
fechei-me com tristeza
estar triste no sonho
é como abraçar pedras
a gente sem querer
afunda
então
em certos dias
não quero deixar a cama
a vontade é puxar as cobertas
amassar os lençóis
entre as pernas
mergulhar na espuma
branca dos panos
esquecer os planos
e medos
e adentrar em cais
e outros
oceanos

Adaptado de
Elefante
de Bartolomeu
Campos de Queirós
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quem me
re
(órgão)
nizará?
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que é porque
falam
demais
que é porque
são de menos
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"eu apaguei palavras que afastavam aquilo que sou de mim
eu apaguei palavras que afastavam aquilo que sou de
eu apaguei palavras que afastavam aquilo que sou
eu apaguei palavras que afastavam aquilo que
eu apaguei palavras que afastavam aquilo
eu apaguei palavras que afastavam
eu apaguei palavras que
eu apaguei palavras
eu apaguei
eu"

Yassu Noguchi
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coincidência

chove
e
faz frio
lá fora só uma lâmpada acesa
a casa reflete
meus olhos
dentro
e
fora























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‪#‎dialogos‬
ninguém nunca deu certo na primeira vez
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já narro
feito índio navarro
só que a flecha nunca acerta
onde eu quero
essa flecha é um pouco difícil
porque
falta arco
falta corda
falta alguém que
acorda
pra colocar
tudo no lugar
falta alguma coisa
falta um alvo
e esse alvo tá muito
complicado
eu quero muito mais
eu queria poder ser a seta
sem precisar de nenhum alvo
e acertar
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me assumi poeta
porque queria ter
mais
coragem
poesia
não se acovarda
- é coisa de almas
fortes
as palavras
precisam
de força
para significar
poesia
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"ora sou equilíbrio
ora mato e destruo"

Fernando Schubach
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em tudo o que se vê
há alguma coisa nascendo
a começar pelo
próprio olhar
a visão não acaba
onde ela chega
ou até onde ela vai
começa até mesmo
no ponto
onde
se
perde
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a poesia
tem suas
c(d)ores
escondidas
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"ela colocou a mão dele
em concha no ouvido
queria descobrir
onde há mar..."

Yassu Noguchi

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o
discreto
charme
do
silêncio:
um
rosto
não declarado
em
público

















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FRAGMENTOS MENORES


"Podia escrever algumas coisas, mas outras não. Feliz de ser o filho do meu pai, feliz de ter emigrado antes de nascer, feliz de contínuo desamor. Era certo que procurava uma pátria, uma verdadeira pátria, uma verdadeira língua. Era certo que procurava a língua e a pátria no antigo tronco familiar, e o tronco aparecia despedaçado, o melancólico ramo materno de um lado, de outro a fúria da ordem paterna. Mas não eram pátrias semelhantes o país pequeno e a grande cidade? Havia em algum lugar um fim maior que a palavra e a classe, a velhice e o tormento, o clamor e a juventude? Não éramos todos, os nascidos aqui e lá, simples figurações do extravio e do engano humanos?"

SE TIVÉSSEMOS VIVIDO AQUI
Roberto Raschella
(Fragmento de romance)

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"Tarde ou cedo, Lucrécio, a natureza das coisas se achega ao afazer dos homens; tarde ou cedo a água daqui, a água das chuvas, a água retida pelos canais, a água parda da lagoa, a água dos tecidos, a água dos encanamentos, a água para o consumo familiar, a água benta, a água servida dos processos industriais, a água não potável, não pura, não cristalina, a água não reunida para o reflexo suavezinho das árvores; tarde ou cedo, Lucrécio, a água daqui, adormecida nos leitos subterrâneos, sobe, fustiga, desmorona-se em correntezas oleosas, em vernáculas erupções que estouram o chão das casas, entre as costuras do barro melhorado; são, a princípio, borbulhas. refluxos de espuma ensaboada, auréolas algo engorduradas; é metástase, Lucrécio, regurgitação submersa, é a pobreza angustiosa dos homens, brotos malformados da terra interior; a água crispada transborda os bulbos, penetra nas raízes dentadas, desdenha o melancólico enfeixamento dos tubérculos esparramados para a gravidez alimentícia; é a natureza das coisas que se achega ao terror competitivo dos homens, e vem de baixo. do dorso da terra; a água daqui arrasta fleuma, fervor infernal, ácido corrosivo; é o real, Lucrécio, a maré do real nas cavernas intestinas, a maré do real supurando seus dejetos construtivos; tudo pressiona, tudo se condensa, mais poderoso cada vez, mais úmido seu levitar nos torrões tumefatos, tudo é líquido insistente, líquido inflamável; a água daqui, Lucrécio, vem por nós, nos torna, nos desfigura, nos afoga como o arquejo afoga o fluir do sentido das palavras."

AFOGO - Luis O. Tedesco

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"Talvez a humanidade possa ser dividida entre aqueles que preferem a verdade e os que vivem melhor com a mentira. O segredo é uma  oscilação entre os dois extremos. Esta história de enganos, mentiras, segredos, é também uma história de amor, na medida em que pode se dizer que todas as histórias o são em algum ponto de sua trama; mas oculta uma paixão maior pelo silêncio e pelos abusos da inocência. Do mesmo modo que a palavra e a pausa se alternam em toda frase para  juntas construírem o sentido, também a mentira e o segredo aqui são correspondentes e compartilham o peso das intenções."

AMOR PELA ARMÊNIA
Matilde Sánchez
(Fragmentos de romance)

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