quarta-feira, 22 de junho de 2016

dos golpes...

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"devagar
o tempo transforma tudo em tempo. 
o ódio 
transforma-se em tempo, 
o amor 
transforma-se em tempo 
a dor transforma-se 
em tempo. "

José Luís Peixoto
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o que não enxergo
só posso sentir
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poemas não são projetos
poemas são projéteis
engatilhados
saindo diretamente
de um cano fumegante
atingindo
aleatoriamente
mente
sem saber onde
fere
ou nem
ou traz
prazer
não se remetem poemas
com flores
ou como mensagem qualquer
atiram-se
revólveres
contra
a monotonia


















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"dizer-lhes simplesmente a palavra amor?
que espécie de promessa desgastada e tosca é essa,
cuja intensidade sequer resvala
na essência do que eu sinto agora?"

Amor & Amargor - Ricardo Otávio Costa

quero o desencontro
do amor planejado
aqueles prometidos em público
aqueles que prometem um amor sob medida
sem sofrimento
eles gravam um depoimento
e trazem ideias erradas das razões
que os levaram ao procedimento
e dizem coisas com um nível de crueldade
que somente alguém que amamos muito
é capaz de alcançar
isso porque detalhes doloridos
manias dos quais nos envergonhamos
do fundo da alma
momentos vis e ridículos
são testemunhados em primeira mão
pelo nosso amor
então
descobrimos
meio desconcertados
que o amor mais encantador
é algo que pode nos machucar
de uma maneira inacreditável
o que é este ser que se ri das memórias
que deseja
para além de todas as razões do contrário
senão o mais doce dos amores?
quando sacudimos as razões
das nossas histórias
o que resta?
o amor nos alcança
ali onde não conseguimos nos perdoar
é quando escuto um "tudo bem"
ou quando as coisas melhoram
quando se menos espera
vindo do nada
melhor o amor inesperado
porque vem desse amor
que nos chama
do lado de lá do fim
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"saber de cor o silêncio
diamante e/ou espelho
o silêncio além
do branco.
saber seu peso
seu signo
- habitar sua estrela
impiedosa.
saber seu centro: vazio
esplendor além
da vida
e vida além
da memória.
saber de cor o silêncio
- e profaná-lo, dissolvê-lo
em palavras"

Orides Fontela, in Alba (1983)
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definição sobre o amor

não é
não vai
não foi
sim é
sim vai
sim foi
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há agulhas
e linhas
costurando
por dentro
há sentidos
estranhos
que não suporto
e desejos
insanos que nos olhos
vertem
sem que se perceba
água
nem é lágrima
porque não é sentimento
é um resto da causa
da consequência
do desespero
mal arrematado
essas costuras
não servem
mais
-
mais
um corte
e a vida
termina
aqui
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tudo
pode ser esquecido
ou transformado
mas prefiro o
trabalho
com o esquecimento
que consome
menos
tempo
transformar
é uma demora
que quando
chega
ao seu fim
produz
um desgaste
imenso
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o amor
pode ser
falso
o ódio
não
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só quem morre pra saber
cortei minhas unhas ontem
após o banho
e vi alguns pedaços
que escaparam no chão
e recolhi
eram restos
pensei em restos de como
são os restos mortais
das coisas que são dispensadas
e dos corpos que morrem
sozinhos cortados
dos laços de vida
deus não deveria permitir
a solidão da morte
se é que existe
cada unha ou pedaço de morte
deveria ser acompanhada
de algo menos solitário
alguma lembrança boa
por exemplo
estranha essa solidão mortal
até mesmo nos vivos
sem memória
ou o próprio esquecimento
do que é bom
a morte não deveria ser uma unha
descartada
pedaços de coisas
que vão se degradar com o tempo
mas parece que tudo é inevitável
o tempo fica suspenso
e nenhuma viagem imaginária
pode corrigir ou conter isso
as unhas descartadas
os medos escondidos
na pele
a inevitável
solidão
somos golpeados
todo o tempo
e apesar de esperarmos
enganamos
a dor
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eu vou dormir
porque a noite é quieta
e o dia
é
amanhã
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dois tempos

parei de viver:
comecei
a
lutar

parar de viver
e começar
a
lutar
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como poeta
sou inadequado
porque não sigo
o vértice
desses poetas
convencionais
sou de cantos
da poesia-segredo
do estado das coisas
de sentimentos
que poucos falam
e muitos calam
e até outros
se matam
só para não ficar
num
quadrado
uma vala
comum
qualquer
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ande
atento
ao
tempo
e onde
adentro
o tempo?
qual luz?
tem caminho?
deixa rastro
o tempo?
nos ponteiros
nos momentos
que aos poucos
vão
se
desfazendo

(até
a gota
risonha
desprendida
é
tempo)

com Vini Miranda
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quero
parar
de lutar
contra o tempo
e insistir
no
agora
o agora
é
passageiro
impaciente
comumente
localizado
entre
o pulo
e os
começos
entre o pulo
e os
tropeços
recomeços

com Vini Miranda
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tem gente que vaza pouco
tem gente que vaza nada
tem gente que nem eu
que vaza muito
que transborda
e parece que vai
se afogar
no meio das coisas pensantes
mas acontece
um vergão
uma marca de lembrança
que estanca tudo isso
essa represa contém
o todo poderoso
sentido
do que não pode vazar
aí então as coisas
se juntam
como aquelas sujeiras
no ralo da pia
entopem e enojam
tornam a vida e os papéis todos
um transtorno tão grande
que nenhuma grade mais
segura
e acontece
o trans

DOR

damento
das coisas entupidas
estúpidas horas perdidas
pensando no nada
e vaza
vaza com lágrima
medo, despudor e poesia
vaza atravessando tudo
um punhal
flecha sem arco
atravessando
o peito
e fica
o
silêncio
compactado
na alma
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sincero-frágil

meu trabalho
mais árduo
até hoje
foi entender a vida
até perceber
que desde sempre
estive
algemado
à ela
essas veias todas
do meu corpo
são prova disso
cada veia uma algema
marcando
pulsando
me obrigando
a ser a vida
e alimentá-la
a todo custo
eu não entendo
o porque dessas
pulsações
sensações
e as loucuras esparsas
correndo nessas veias
indo parar na minha cabeça
lembrando
lembrando
lembrando
da vida
da obrigação da vida
da sensação
da vida
então não encontro resposta
nenhuma
e sigo o que penso
a vida é uma algema
que pulsa
entre veias
desamparadas
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"o poema
também se faz
daquele verso
ausente,
aquele que seria
o ouro da poesia.
aquele que vem subitamente
e nos habita à luz
da solidão"

Poética II
Hildeberto Barbosa Filho
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não
é

o que te
arrepia
é
também
o
que
te
faz
chorar
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‪#‎dialogos‬

a fé
é uma coisa
que acontece
você acreditando
ou não
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o dia
é alguém que te ama
quando aberto
voa
quando cinza
enigma
só por cima
das nuvens
se consegue
ver
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as idades
chegam
em horários
inimagináveis
ou chegam muito
tarde
ou você recria
o dia
ficando horas por ali
e depois vai embora
e ninguém sente
que passou
amanhã irá se abrir novamente
o céu imenso
outra idade
como a boca de um lobo selvagem
nuvens
frágeis nas quais todos de despedem
todos estarão perdidos
em milhas de terra sem gente
sem que
se tenha medo de ser achado
na agitação
dos pássaros
no voo dos carros
nos redemoinhos
barulhentos dos encontros
das
gentes
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o que tu amas
mesmo que pouco
permanece
intacto
até
segunda
desordem
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