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"Tem um tipo de amor que é afeito ao parque de diversões.
Gosta de rompimentos que gerem confrontações e é um tanto egoísta:
não tolera esse negócio de “dê asas e alcance a liberdade”!
Quem declama o amor livre não conhece a sua carnificina.
Não sabe que esse tipo de amor é barroco e gosta de brincar de claro-escuro,
gosta de repetições e de engrenagens: Ele é autômato.
Amor também é quase uma sentença, se escrito em língua latina.
Amor inglês é bonitinho, feito de coraçãozinho recortado com tesoura de picotar.
O amor latino é assassino: mata ego e superego dos desavisados.
Planta saudade antes do tempo.
E olha que não se dá ao desfrute da rega e da adubação:
a plantação é a seco e a colheita a unha.
Amor de criancinha é egocêntrico.
É uma escrivaninha com inscrições feitas com objetos cortantes.
A garatuja e o garrancho, o primeiro palavrão e o primeiro beijo,
o chifre e a auréola ficam registrados.
Gravado com um sabre o amor da criancinha
é uma gracinha aos olhos das corujas.
Amor bom é o amor que não precisa de trocados.
Está no beijo da mãe, no recado do pai: Não chegue tarde!
Também está no trapézio onde se finge voar, está no ar, talvez,
quando olhamos pra cima. Está no respirar fumaça e no tragar carvão.
O amor está no pão repartido e na rima mal feita das cartas mal escritas.
O amor bom está, geralmente, na desnecessidade do eu te amo
para fazer-se entender.
O amor é um tigre. É silencioso, faminto, belo e selvagem.
Nos possibilita criar imagens fantásticas e sucumbir ao lúdico pensando-se lúcido.
Dizem que nos dá asas, inclusive aos que sofrem de acrofobia.
O problema é que a maioria sofre. Talvez por isso sejamos bípedes.
O amor é misericórdia. É um sol radiante de setembro no hemisfério norte.
Por este aspecto é um corte na precisão da filosofia que dele nada explica,
apenas o impõe outros conceitos e termos extraordinários que lhe subjugam a conjecturas.
Amor é o primeiro olhar, a primeira poesia.
Gosta de brincar de dar susto. É o despertar.
É encontrar a palavra-chave, e ter a porta.
O amor é uma porta feita de quadro-negro, e sem apagador.
Por trás das marcas lantejoulas, fica sempre a complexão de entender
que ele faz fronteira com a dor num campo minado:
aos desavisados Cuidado; aos impetuosos Respeito.
O amor é o que ultrapassa.
Por isso é necessário correr."
A vida secreta das palavras: o amor - Marinaldo de Silva e Silva
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conhece-te a ti mesmo |
#ira
saldo lírico
e força bruta
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o acaso vive programado
para acontecer
depois do meio dia
o acaso carrega teoremas
ausentes nos encontros dos
amantes
e nos taxímetros
roda quando quer
e cobra o tempo
passado
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a paixão
é um estado
de sítio
o acaso vive
pregando peças
na paixão
em estado
de sítio
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prefiro o mistério
do barco ao mar
do que qualquer âncora
presa
no
cais
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tem fornalha
aqui dentro
e pra quem não entende
deixo só faísca
nem gume de faca
nem nada que corta
o que fica
sempre detrás da porta
é a poesia
essa pobre angústia escondida
em cada coisa da vida
que se carrega do nada
aprender
com os outros
a desistência
enquanto aqui dentro
a resistência
atravessa
que nem bala
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até que ponto
você admite
metáforas
do resto de um corpo
aceno longínquo
da memória?
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sem legenda
gente que vive
a vida
gravada
e dublada
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e mais uma vez entre as coisas me sinto obrigado a pegar todos os coices sem dar rebote
o coração virado em bichos
os aplausos virados pelo avesso
quanto tempo falta
para eu não esperar
mais nada?
quantas palavras
a gente tem que dizer
até que entendam
que a gente não quer falar
mais nada?
quem é que
sabe?
quem é que
salve?
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e que não se faça
mais
nenhuma ideia errada
da textura grosseira
dessas linhas
do rasgo de qualquer poema
que a palavra
insinua
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o desejo faz
um caminho de teias
sobre a pele
ainda quente
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os poemas se dão
sem que eu os busque
é dado lê-los
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queria ser paisagem
momento
essa avenida
cheia de carros
em movimento
sabe-se lá para onde cada um vai
queria a inocência
sem descanso
dos faróis
brincar na faixa
de segurança
e construir
moinhos
de silêncios
esfregados
na cara dos outros
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pra gente
que quase
não vê
o corpo não conta muito
a gente o possui
e transporta
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pelas ruas
vejo gente que
anda
como se tivesse
cauda
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exorcizo meu desgosto
nessa calmaria
tumultuo
agarro a força
e corto
com faca
como se
tirando migalha
de pão
depois escrevo
sobre a cicatriz
o relatório
parcial
do treinamento
dos
assassinos
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pensavento
é quando eu penso
e some
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cansado de esperar
o verão
virei inverno
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quem está junto
e não se encontra
está só
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corpo vazio
desencano
e
passo o ponto
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palavra
tem gosto
de nada
(depende de onde vem)
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olho azul
nasce jade
serei breve
com as coisas
que não são minhas
debaixo da pele
encontro
poesia
desvio os olhos
feito mentira
passei essas coisas
em silêncio
olho adiante
antes que
tropece
na luz
do sinal
vermelho
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o problema
não é o que é
notícia
mas o que deixa
de ser
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no ponto final
o poema acaba
e sua porta
fecha
o
fim
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