quarta-feira, 6 de abril de 2016

das mãos...

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"Muitas línguas
voam neste mundo
e colidem, causando centelhas;
às vezes, são ódio,
às vezes, são amor.
O prédio da razão
está a arruinar em silêncio.
Cestos tecidos com pensamentos, tão pálidos
como feixes de bambu,
enchem-se de cogumelos, cegos e venenosos.
Na pintura de rocha, os animais correm
pisando as flores;
um dente-de-leão cresce em segredo
em algum canto,
e as suas sementes são espalhadas pelo vento.
Muitas línguas
voam no mundo,
mas o que as línguas produzem
não aumenta ou reduz
o sofrimento calado do Homem"

Língua - Bei Dao
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hands free for Gabriel

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ANIMALIA - adaptado de Vini Miranda


desbrava
em mim
homem
carne
e sexo
passeia
as trilhas
descampadas
do meu desejo ardente
e sujo
contra o teu
espreita
com teus
lábios
sábios
salgados 
templos
do meu pescoço 
ávido 
às minhas coxas
trêmulas
devora-me
no canto
da boca
no teto
das casas
entre as frestas
sob os muros
e eras
concretas
alardeias teu som
de fera
e se apressa
a arrancar
sôfrego 
o fôlego,
sopro
e chama
completamente
apaixonado
incendeia-te
bruto singelo
dentro do meu castelo
a pequena morte
e consome de nós
os restos tortos
e doces
de outro tempo
mais ameno
diminua
seus venenos
e que tua presa
ceda
aos meus encantos
mastiga-me
posto, o seio farto
que o alimenta
messalina tua
a prover-te
leite
gozo
e permanência
visto que só
se adivinha como tua
a cavalgada
os incêndios
todos
intrépidos
de lava
e saliva
escorrem
certeiros
até pelos meus
cabelos
por ora
benfazejo homem
do teu corpo
nenhuma
mulher escapa:
sou tua
escrava
em absoluto
desvario
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engavetar os pensamentos 
e soltar os sentimentos
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enredos de pensamentos
abelhas no crânio 
e na face
o mel
arde na boca
mas não se sente
nada
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se eu não fosse um problema 
qual a importância de alguma solução?
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astrologia

os signos são animais
e isso me inquieta
planetas e estrelas 
são rochas
e poeira
colocadas 
no espaço 
e isso me inquieta
animais, poeira, rochas
são coisas muito antigas
minha pele é de um animal
não nego
que respira poeira 
e pisa em rochas
tudo se faz previsão 
mas onde esses animais
em outros 
estão?
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sai pela poesia
e me esqueci
de fechá-la

quando eu voltar
pra casa
quero um poema
pronto
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na madrugada
o espelho
me faz triste
devido
à pouca luz
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ambos lentos
                           para Sérgio

roídos
doidos ou doídos
pés de um amigo
seu andar é quase plano
e as coisas passam devagar 
pela fumaça do seu cigarro
o ritmo mudou
mas eu sinto 
que seu corpo
se acelera
por dentro
as nossas velocidades
amparadas 
andam juntas
e com um cuidado
íntimo necessário 
aos pensamentos leves
os pés e os olhos lentos
abrigam
os cuidados
e os cigarros divididos
juntos pelas ruas
e o que é lento
torna-se
calma
coração 
e alento
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todo dia acordo 
defendido
dispersivo
opressivo
míope 
em linha reta
todos os dias
me encontro com alguma 
luz
ofusca e fere
e sigo em frente
como um farol
às avessas
e ando memorizando a sombra
fugindo de um sol a pino 
íntimo
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desvio
me transformo
na observação 
de um corpo
em ossos
de borboleta
enquanto outros
me atravessam
na concisão 
de suas ausências 
fogo e cinzas
na fração de segundo 
necessária 
a próxima palavra
a ser dita
ou mesmo que o silêncio 
transpareça 
num olhar
como um sentido
invisível
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the word 
is all that is displaced
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às vezes 
quero ser
às vezes
quero estar
às vezes
quero estar e ser
juntam-se 
todos os meus sentidos
vida em movimento 
sei que vai se extinguir
não sei o que vai ficar
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dentro de mim
na cidade onde moro
tudo foi construído 
com blocos de montar 
ruas com atalhos e becos
sem saída 
a praça cheia de vontades
muito ampla
apesar dos altos e baixos relevos
na cidade onde moro
dentro de mim os prédios 
são deliberadamente
desordenados
e não existem pessoas
visíveis que só aparecem
sentadas nas praças 
feito memória 
na cidade onde moro 
aqui dentro
o vento sopra e atravessa
portas e janelas 
sem nenhum aviso prévio 
e os faróis sempre desligados
atravessam automóveis 
desgovernados
sem ninguém dirigindo
dentro
o vento emite um som pouco audível 
e a brisa vem com o pó 
das coisas antigas
na cidade onde moro
mesmo que eu morra
as coisas serão sempre infinitas
porque na cidade onde moro
existe uma alma
eterna
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recriar a noite 
para recitar
espantos
a lua branca
é um animal
difícil 
ainda aguardo
as respostas
das estrelas
até as cinzas
das lágrimas 
secarem
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encontrar é difícil 
separar também 
é difícil 

entre essas duas coisas
um hiato
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tiro o coração 
do inverno
a noite sempre
é um mar negro
de pensamentos
ao avesso
quando a água mineral
e os ansiolíticos
me refazem
artificialmente
quando a memória bate
volto pelo caminho 
do avesso
caminho mais longo
que o certo
longo como a vida
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meu coração 
entra de férias 
de tempos em tempos
num espaço vazio
chamado
solidão 
aqui onde meus crimes
não podem ser julgados
e a pele ossuda
se acalma
até um anjo
surgir 
e desterrar
meus ossos
com a delicadeza
das raízes
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let me be your second skin
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#dialogos

me deixa um pouco triste quando você fala isso 
(que você me ama) 
é uma pena que eu não consiga falar o mesmo
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