sábado, 19 de dezembro de 2015

das imensidões...

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"a sorte faz, às vezes, 
com que se encontrem com as algas de almas. 
misterioso é o seu comércio,
mas existe."

Ricardo Corona
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espaço consideral

quando faz poesia
o poeta empilha
estrelas
e o poema
vira
galáxias
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remover lábios
para comemorar
o céu da boca
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preciso
de uma força
sem plumas
..................................................

em mim
nem tempo todo existe
nem tempo algum
é válido um incêndio
porque sendo como fogo
mesmo com sua dança
desviante
queima
..................................................

poesia no fogo
poesia em brasa
palavra cinza
crematório
nada mais
nem fênix
aquelas asas
são um mito
e o ovo
de
pedra
bruta
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somos seres abotoados
em querer ser tudo
conter tudo
apreender tudo
quero a síntese-bomba
dessa
represa
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vivo a vida
em um nu
existencial
..................................................

misturo
poesia
e sonho
para melhorar
a qualidade
da realidade
..................................................

tem dias que me ocorrem
e me prendem
por todos os lados do corpo
então
sou poeta
um ser emocional
em todas as
direções

"o tempo não é um estudioso da anatomia humana"
Gonçalo M. Tavares

tudo o que penso
não é nenhuma
certeza
é só um cálculo
poético
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eu tenho
um sistema geral
de pensamento
chama-se
absurdo
ou
abismo
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formas
mudas
de se voltar
para
casa
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depois
do ledo engano
o ledo
ato
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as coisas direitas
arqui
dextrura
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preciso de alguém
que entenda
o meu desespero
pelo lado
de dentro

(por fora todo desespero é igual)
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eu não gosto de escadas
elas me atrapalham
o vento
degraus são filtros inevitáveis
entendo as rampas
porque respiro
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o que ele fez foi escrever
inundantemente
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das faltas que sinto
iguais ao mar
sinto um gosto
de
sal
dades
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o instante que antecede
o arrepio da pele
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a pedra que tropeça
e desperta
para o que há
ao redor
..................................................

desentupir as ventas
num ritual
dali há pouco
a dor capaz
da segunda vez a respiração
prolongada
sincronizada
com o outro
e uma calma intensa
imensa como montanha
(aquela represa
se abriu num choro)
as mãos sobre os joelhos
âncoras nas unhas
o apego inevitável
à uma sensação
plena
da segunda vez
serenamente
sorri
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o ser subterrâneo
e o ser subcutâneo
pessoas andam
despreocupadas
dos seus sacrifícios
vejam suas cruzes
cada crucificação
um medo
uma alma agarrada
a algum
sonho
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o fim de tudo que entra no meu olho
chorar é chover
molhar
aguar
aguardar
qualquer dor
entre aliviar
e sumir
entreposto de lágrimas
esse olho
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percebia a sua sombra
sobre a minha
as mãos bem juntas
apertadas
e esse cabelo
todo enrolado
feito memória
eu ouvia seu sono
igual seu violão
percebia seu sonho
iguais aos tambores
ancestrais
desesperado
para ficar dentro
ser um sonho só
porque cansei de estar
sem sonhos e companhias
eu vim de um
e encontrei assustado
um outro
caminho
caminho
querendo essas almas juntas
sem apego
mas quase impossível
não sei amar
sem desapego
quero almas únicas
e olhos que se entendem sem se ver
olhos que substituam os meus
olhos como um abraço
sentindo o vento
numa rua isolada
perto do portão
de ferro enferrujado
da casa
que moro
sem rotas automáticas
e as coisas inesperadas
acontecendo
olhando para o céu
olhando estrelas
com os seus óculos partidos
e os meus olhos paralisados
sentindo estrelas
como se fossem
diamantes
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na cidade sem mar
o horizonte
é feito de fumaça
e seus neons
a linha sem estrelas
sem um fundo
dentro
da cidade
o horizonte
é luto
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em cada lugar
que parei
deixei um pouco
do meu ponto
de partida
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o vento labirinto
absoluto
no silêncio
às batidas do coração
me entrego
ao estado
de vida
me entrego
e outro poema
vem
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memória zoológica
para lidar
com o mundo
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a cidade da memória
é invisível
paisagem muda
paisagem que não muda
que vem em sonho
soluçar intensamente
por cada lembrança
e deixar a tremenda espuma passar
emergir
e perceber que tudo
continua como era antes
voltar ao melhor
e a paisagem
torna-se
amável
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mãos e pés
me rastejam
e o que é puramente visível
é reinventado
quero largar
meus barcos
para ser
vento
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há lugares
onde não chega o oceano
mesmo assim
aqui
acontecem
objetos
que bóiam
e a gente não

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sou o avesso das coisas
voltadas
para o infinito
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o mar tão longe
água de escorregador
tão salgado
mas eu sinto
até
o sabor
daqui
areia
me afoga
intenso
o sol
me
escapa
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levantar voo
na qualidade do
desconhecido
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para Vini Miranda

ontem
sentei
com um certo amor
no nosso lugar
na Paulista
e ele me disse:
- aqui q você ficava
com aquele cara
que você só fumava
"beck" com ele?
eu disse sim e veio
saudade agarrada
de nó na garganta
de vontade de te ver
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porque não mais espero retornar
porque não quero mais retomar
pedaços de textos antigos
porque não espero
porque não espero retornar
quero criar um novo dom
em que a arte me observe
como humano
não mais me empenho no empenho das coisas inúteis
(por que abriria a velha águia suas asas?)
por que lamentaria eu
afinal
esse medo esvaído
de um reino comum ?
porque espero conhecer
(e desejo)
a vacilante glória da hora positiva
porque tento não pensar mais
porque sei que de nada saberei
e as conclusões são sempre
processos de uma angústia
desamparada
do único poder fugaz e verdadeiro
porque não posso beber
lá, onde os carvalhos florescem e as fontes rumorejam
e as visões são mais claras
pois lá nada retorna à sua forma original
porque sei que o tempo é sempre o tempo
e o tempo é essa angústia da vida
sem controle
e ameaçador
dor do espaço entre os atos
e o espaço é sempre o espaço apenas
e que o real somente
o é dentro de um tempo
e apenas para o espaço
que o contém
pequeno
lento
e com algumas esperanças
preenchendo
alegro-me de serem as coisas o que são
(às vezes inconformado, não)
e renuncio à face abençoada
e renuncio à voz
porque esperar não posso mais
e assim me alegro
por ter de alguma coisa edificar
na espera
de que me possa depois rejubilar
e rogo a Deus que de nós se compadeça
e rogo a Deus porque esquecer desejo
estas coisas que comigo por demais discuto
por demais explico
(inutilmente)
porque não mais espero retornar
que estas palavras afinal respondam
por tudo o que foi feito e que refeito não será
e que a sentença por demais não pese sobre nós
porque estas asas de voar já se esqueceram
e no ar apenas são andrajos que se arqueiam
no ar agora quase exíguo e seco
mais exíguo e mais seco que o desejoescondido
mas não estagnado
ensinai-nos
o desvelo e o menosprezo
ensinai-nos
a estar postos em sossego
rogai por nós pescadores em águas estranhas
agora e na hora de nossa sorte
rogai por nós agora e na hora de nossa possível morte
enquanto espero
sofro

Adaptado de ELIOT, T.S. "Quarta-feira de Cinzas".
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o poeta
desconhecido
não se sente
menos
vivo
porque se ocupa
da palavra
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você é numérico
eu sou onírico
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essa velha sede
de sangue
e água
esse velho corte
de alma amputada
aplauso em final de espetáculo
aguardo um fim
memorável
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até onde sei
ainda
me salvará
o amor
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prefiro me inspirar
com o meu cansaço
com a pele
arrancada em gotas
com minhas imagens
aos pedaços
aos poucos
contando os passos
com o medo de cair
pisando na água
os óculos marejados de chuva
e os olhos chorando
uma tempestade
do lado
de dentro
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vou avançando
e espero o dia
em que Deus irá disparar o gatilho
não porque eu queira morrer
mas porque quero bater um papo com Ele
muito a sério...
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toda luz
tem seu
inverso:
um campo
de forCa
atado
à um pedaço
de vidro
inerte
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quando as coisas do coração
ficam nesse chove-não-molha
eu recolho o guarda-chuva
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decepções
em tempos
de crise
e fúria
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entrelinhas
às vezes
estou disposto
a me entregar
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eu sei que sou feito
aquela fumaça
antiga
da chaminé
que algum
passado
apagou
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a impaciência
é a coloração
natural
do
medo
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aguardar
um futuro incerto
uma ponte
sobre uma correnteza
imóvel
..................................................

sinto um pouco a dor
nas pernas
cansadas
e por
ali
na fenda da porta
escapa um sol
tão meio azul
que espanta
luz
gosto mais de nuvens
pelas frestas
que um céu inteiro
delas
onde de tanto céu
eu acabo folha cadente
branco é uma cor de nuvem
sem estrago
sem o tempo
pra trazer tempestade
eu podia ser nuvem
sem o cinza
do meu incômodo
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a fé comove montanhas
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