sábado, 1 de outubro de 2016

dos efêmeros...

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"sonho o dia em que as pessoas
ao despertar
encontrem no meio da bunda
um rabo
e se tornem incapazes
de esconder seus sentimentos.
aguardo o dia em que não tenham
a vergonha de mostrar os dentes
e deixem a traição de lado.
sonho o dia em que elas
deixem de ser tão humanas
e se animalizem mais,
pois em nome da humanidade
temos devastado os nossos outros.
mas enquanto não chega o dia,
talvez possamos provar
o que seria
sermos menos intelectuais
e um pouco mais autênticos."


Jean Luiz Palavicini


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                                imagem de Guilherme Pinkalsky

























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nox foi

eu lia e enquanto ouvia
lia melava meu corpo de solidão
levava minhas veias e vias
de nome alegrias
regresso meu grito
um sepultado grão
ele alinhava as teclas
num corpo rasura
usura em seus tons
e mais as tristonhas mentiras
mais tarja, censura
enlutando os meus dons
enquanto o carro corria
enquanto praguejava
eu desistia de ser
desistia de escrever
não coloria nem meu rosto melado
chorando um engano
cor dura e desbotado de cores cegas
e lia beijava e benzia
e sobre a cama vazia
a bíblia não fazia sentido
de frio e semblante
nem um beijo havia
no breu sonoro
para qualquer que seja palavra
não dá mais um som
sem sal sem som sem sol
ele em mim me mela
feito cola colando a tristeza em meu couro
o tempo a foice de aço
no teclado
amola prensando
meu melaço sangradouro
de ilusão
cava
veia cava
mina, mina, mina
minha mina
de solidão
então
tem horas que aceito
que você se foi
chego a ter não medos
que você se foi
desço no aconchego
que você se foi
apareço sem apego
volto ao desapego
e você se foi
nem faz mal meu desespero
nenhum desassossego
que você se foi
é no chão que me aconselho
que você se foi
é no colchão que me acomodo
que você se foi
na raiz desses anseios
a própria vida
são as plantas na janela
suculentas
que ousam dar
vista a vida
que resta

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imediata
mentes
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a dureza 
das sensibilidades
possíveis


desculpe
se fui muito duro
com você
desculpe as palavras
entregues sem pena
aos seus ouvidos
sua fragilidade passa
pelas teclas e dedos
seu tempo é precioso
na reflexão do caos dos dias
não somos muito distantes em causa
e consequências internas
será para mim a sua falta 
como a palavra do corpo que abracei
eu sou cruel
na voz
mas suave
na alma
que você tocou
em uma espécie de amor
e cada amor
teclado
poema
ou palavra
precisa do seu tempo
fique bem
e
até breve
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o fio da meada
o olho na beirada
meus precipícios
são os degraus
da ansiedade
e do medo
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minhas reviravoltas
ensurdecem a todos
tanto que eu não consigo ouvir
nem a mim mesmo
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mas pensando bem...

eu poeta
não tão romântico
mas sensível 
acredito
no amor
possível
líquido
e fluindo
mesmo que
não seja
eterno
enquanto
fluxo
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olhos
acima
d'água
para que não haja
lágrima
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obscuridade

alguns dias
juntos
de conversas e peles aproximadas
entendimentos e turbilhões
dois passados e um outro
mergulhando no meu mar
um encontro de lágrimas e de águas
a compreensão da dor e do prazer
das almas
uma a uma expostas
deuses e demônios internos
e dores
explícitas
e amores
antigos desmembrados
com a foice
da memória crua
o choro das perdas
e as promessas
mas promessas são coisas
inúteis se não forem atos
e as diferenças:
a ganância
a poesia
a política
a convicção
a ciência
e a religião
meus ídolos não são o que você pensa
sua crença me faz forte
mas enfraquece o amor
mais bonito
que possa ser entre nós
ou entre qualquer um
depois de mim
o beijo ausente
do medo infundado
de alguma intimidade,
entrega,
ou qualquer que seja a conclusão
meu stress extremo
sua ganância interna
(poetas não entendem a matéria)
apenas sentem
minha vontade é plena
e "não sei"
é um espaço estranho de incertezas
e dores muito próximas
saber o que eu quero
o que preciso
para nos "eu sei"
"não sei"
é jantar com o vazio
que eu já tenho
por dentro
você adiou respostas
como quem não sabe
longas reticências
EXTREMAMENTE
angustiantes
adiamentos são os "nãos"
que ouvirei no futuro
você está por carência
medo da solidão ou
confusão mental
eu quero coisas de verdade
não qualquer conclusão
que se resolva no tempo da calma
a calma vem quando estamos juntos
depois disso
enquanto me angustio
e seus interesses me deixam
em outros planos
penso que "esse filme já vi antes "
e eu sei que quero você
e não quero ser só seu apoio
quero ambos acordados
sem ter que passar dias numa cama
discutindo amor e sexo
sem uma vida
do lado de fora ao sol
tenho a vida como prioridade
e a poesia como movimento
quero muito que a raiva
deixe de me mover
quero de novo
me movimentar pelo amor
(que você disse poder me dar)
mas sinceramente
você disse que me deseja
na sua vida
mas a sua vida parece
não me deixar pertencer a ela
se você vier sábado
venha inteiro
como sendo parte da nossa vida
não venha com um "não sei" ou um "deixa rolar".
venha com a convicção
de que o que
realmente aconteceu
entre a gente
foi um milagre
e que seja um milagre
eterno
que acabe
com nosso cansaço
da vida
porque eu quero
nós dois
plenos
de
amor
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suor e sede

o suor
é uma mistura
da essência física de uma pessoa
e a essência emocional
em um momento
particular
< oh deus! >
o suor representa sexo
para mim
oh!
adoro o cheiro de um corpo
após o sexo
(arfando)
bem, não se trata de encobrir-se
não é algo que saiu de uma garrafa
é como um perfume pessoal
entende?
especialmente o suor dos braços
pela manhã
como o suor interno das nádegas
e das costas
e por trás dos joelhos
e acho que o suor das axilas
é o mais forte que podemos ter
isso me faz pensar
no ensino médio
quando eu estava no vestiário
havia um receio de ser pego
cheirando as axilas
e também um tipo de voyeurismo
pois eu estava excitado
pelo cheiro de suor
nos vestiários
e tudo o que isso representava
para a minha visão de masculinidade
< a lembrança do suor dele não chega nem perto
da verdadeira essência de senti-lo
é como um fantasma
de sua verdadeira presença>
trata-se de ser um verdadeiro animal
quando você transa
estimula o cérebro
estimula seu sexo
então
se eu olhar para ele
a coisa mais interessante para mim
é o movimento
bem
o suor é basicamente
a manifestação física da energia de um homem
ninguém se importa em meter a cara na sua bunda
que está suada por estar transando
contigo
isso faz parte
trata-se de ser bem sacana
sem ser pudico
pois aqui não se permite
o suor nos dá um lugar
como um espaço repleto de tesão
no qual apenas nós
o nosso cheiro
e o nosso gosto
estão presentes
e isso é extradimensional
às vezes
e é muito bom
é muito forte
eu gosto disso
então o que penso sobre isso
não importa o quanto
você tenta transar com um homem
ou beijá-lo
ou chupá-lo
ou o que seja
você nunca compreenderá
sua existência total
mas se você cheirar alguém
de repente, tudo ali
no seu cérebro
desperta
e isso é sexy
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os amores são assim
os rumores são assim
feito superfície
feito alagamento
cachoeira, água e vento
substâncias naturais
imprevisíveis
assustadoras
holocaustos internos
até que o desejo
se configure
aspas antes
de qualquer
sensação
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a mente apaixonada é egoísta
está tão focada no desejo
que a razão vira só um ruído
quando acontece
às vezes
cruzar a linha
do que a gente deseja
e do que nunca
poderemos ter
isso nos faz
cometer atos
insanamente
artesanalmente
apaixonados

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"A tragédia deste tempo é que os loucos conduzem os cegos."
SHAKESPEARE, William, King Lear, act IV, scene I. In: Pedrosa, Inês (org. e trad.). 
As lições de vida de William Shakespeare. Alfragide: Dom Quixote, 2016.

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