segunda-feira, 24 de outubro de 2016

das conjunções...

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"(...) e meu coração –
não se pode planejar com o coração, mas
o que nele há de melhor, minha poesia, está aberto."
(Frank O'Hara na tradução de Ismar Tirelli Neto)
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greve de delírios 
no meu olhar 
saíram todos 
ofuscando no céu 
nuvens pasmas

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dramaturgia

mas há sombras 
que se imprimem
nas paredes

tentáculos 
alongados
para lembrarmos ainda 
quem somos
e a soma 
de
nós
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"para onde vamos é sempre ontem"
 Ruy Espinheira Filho
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 receituário

é nos vazios
(nas entrelinhas)
da vida
que se prescreve
um poema

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e naquele poema
contido
que travesti com palavras
de linhas tortas
e pouca métrica
baseada somente
em um pouco de mim
que já foi
longe demais
eu poderia tudo isso
se com sorte
algum dia
com um andar-vôo
nas minhas linhas-letras-tortas-poesia
permitir realizar
todas
as minhas
vontades
mas os desejos
são essas ruas
nau sem rumo
desestabilizados
a âncora de um desejo
é a mesma linha torta
deste poema

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hídrico

chorar
na órbita exata
das minhas escolhas
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o que importa é a vida
e a vida
não cabe
num poema
ou numa trama
estreita
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remoendo
os ossos do ócio 
e as palavras
do ofício

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somar para não somatizar



num apaixonamento
todos os sentidos
fazem o mesmo sentido
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não tenho medo de mais nada
só do 
nada
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"a ideia de lirismo no selvagem.
ser filho de si mesmo, inventar-se,
por mais estranho e diferente
que pareça.
ser outro em sendo o mesmo.
tesouro ou castigo. 
leveza de rede,
ou peso de pedra, que se carrega,
além da própria força.
alvoroçar o silêncio,
enchê-lo de palavras,
aniquilar a tristeza com a bomba
explosiva de uma gargalhada.
é tudo uma questão de olhar bem
o que se vê.
não se deixar esmagar pelo pé
todo poderoso do destino"
Dirce de Assis Cavalcanti
"A ideia de lirismo no selvagem". 
In:_____. Dia a dia. 
Rio de Janeiro: Ibis Libris, 2016.
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amor 
é um rio
sem margens
nade 
até
o 
fim
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sim
sou vulgar
como qualquer sol
se pondo
mas não
me
prostituo
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três outros 
(que não eu)

“Vivo de acrescentar às coisas
o que elas não são”
Alexandre O’neill


"a palavra
já cansada
de ter asas
pousa na
folha alva
o que a aguarda?"
Adriano Nunes - A Palavra

"tarde aprendi
bom mesmo
é dar a alma como lavada"
(Ana C.) - O Homem Público N. 1 - A Teus Pés.

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essa pessoa é a mesma
que se atira nas raízes dos seus braços 
e se retira em pedaços 
como obra inacabada
esse reflexo no espelho 
é o reflexo de 
tantos 
outros 
reflexos
máscaras de tanto 
muito 
choro
ressecado
pelo tempo
coragem
perguntou para o homem ao lado
essa pessoa 
ainda sou eu?
não sou
pornográfico 
desses que batem
de porta em porta
em orgasmos 
inúteis 
não sou
pornográfico 
desses 
de imagens de nus
espetaculares e invasivos
minha pornografia
é entre quatro paredes
entre quatro palavras:
"eu te amo muito"

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podia
podia
podia
e 
noite
e
dia

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palavra do dia: idiossincrasia

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por aqui sobrecorrendo atrás de tudo 
sobrevociferando como as feras de eras passadas 
pra melhorar esse futuro incerto e nada poético
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protegido
atrás desde muito
atrás desse muro de palavras
reorganizando
a muito custo as pedras
da criação poética 
andarilho sobre cada
rima ou frase ou coisa solta
tudo isso.
muitas vezes sem entender
onde vou estar ou parar
ou me deparar com a próxima 
emoção numa esquina
numa causa
numa casa abandonada 
descalço de coisas ainda
ausentes
que a distância das impossibilidades
me trouxe 
e amargamente
como se pisasse em brasas acesas 
sob os pés da poesia
recrio o alívio 
do desespero
da falta de afeto 
calma
estranhamentos da alma 
salvos pelas palavras
pegas, assaltadas, extirpadas
do muro de mim
e de outras paredes
que um único poema
arte em si
derrubou
e aí nesse momento
escuto
a voz
da descoberta
do outro 
e da forma 
como o mundo
tão deserto
sobrevive
quando a arte 
resiste

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antes o gozo
que o desgosto

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hiperespaços*

entre o que se sente e o que se vê
todo poema é uma forma de diferença
estrata

gema
exato
se digo: amor
não é amor que simplesmente digo
estou dizendo outra coisa
uma vasta e terrível metáfora
e não este sentimento
imponderável
amor dito assim num poema nunca é amor mesmo
é sempre outra coisa.
então quando escrevo qualquer coisa
qualquer amor
me vem à tona
por menor que seja o entorno 
parte de um ritual
de signos onde tudo são sentidos emaranhados
ensaios
que cada leitor vasculha e encontra aqueles
que melhor se adequam a si mesmo
sentimentos
acoplados
à determinados momentos de suas vidas
toda a vida é vasta
assim como um poema: múltiplas leituras
múltiplos
amores

*releitura do poema de Sérgio Villa Matta
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assim é
se assim 
fosse
a fossa

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enquanto
os sinos
ao fundo
sentem
o mesmo
que
eu
rever
beiram
a loucura
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