segunda-feira, 17 de outubro de 2016

das lunações

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"na melhor das hipóteses,
meu poema, você será lido atentamente,
comentado e lembrado.
na pior das hipóteses
somente lido.
terceira possibilidade –
embora escrito,
logo jogado no lixo.
você pode se valer ainda de uma quarta saída –
desaparecer não escrito
murmurando satisfeito algo para si mesmo."


Wisława Szymborska 

"Para o meu próprio poema".
In:_____. Um amor feliz. 

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16 de outubro
lua em áries
lua em mim
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a sociedade cansa
a saciedade
não
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o tempo
sempre brinca
com gerações
e gerações

o silêncio
sabe de cor

o espaço
é uma memória
que não esqueço

aperto com ambas as mãos:

suco
de
lembranças

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para Michelle

não ter paredes deveria ser bom
mas gera exposição
fragilidade

quando as paredes caírem de um lado
será possível correr
e de tanto correr
andar
circular e voar
será possível ver voltas
curvas profundas
o mundo perderá os cantos
encantos
serão
visíveis

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das possibilidades de se ter um nome
e não ser um homem
de bem


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me busquem em outro lugar
me aceitem
vazio
entreaspernas
entreaspenas
se arrasta um tigre
que aparece
de repente
de um outro território
escondo
encontro
a
lua cheia
vestida
com um perfume claro
para cada ocasião
às vezes vazia
como aguardando
estrelas em pó
espelhadas
pela noite
adentro

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ampulheta

não é mover ou sair
nenhum dos dois de um abraço
ou inventar uma desculpa
onde todo o passado
está acorrentado

os fios de cabelo se trançam
com o rumor da maresia
caem a beira mar
como a pele da areia
areia nova em praias vazias

é a chegada do tempo
a volta da ampulheta
para começar outra vez
mas de outra maneira
ninguém precisa se mover

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não conto com vocês
eu canto com
eucantopontocom
pronto

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algumas pessoas
são como
um feriado
num domingo...
...desnecessárias


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eu
labiríntico
de amor
e guerra

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ser
ou
não
ter

ser

ou

não

se

ater

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vade mecum

bem de perto
todo mundo
animal
igual
vade retro
que a demora
seja longa
espero


bem de perto
ninguém
é de
ferro

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"todo o meu corpo é um nervo exposto"
Paulo Becker

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teclar
poemas
antigos
e atirar
pedras
nos telhados
dos outros
com palavras
inéditas

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“Pegou o chapéu, 
embrulhou o sol, 
então nunca mais amanheceu.”
Menalton Braff

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o oposto de vício é conexão

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isso de querer navegar
por mares tão rasos
ainda vai nos matar
de sede

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em dias nublados
como hoje
sol
lhe
dão

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desculpem meus transtornos
- estou em obras















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nova genética

para Naej Pala

pala_lelos
para alelos
paralelos

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Like a Mirror Loves a Hammer

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"de repente a grande urgência
a Hora
a Violência
éramos nós libertando-nos de nós."

Dina Salústio

para Magda

I

será
poema e não barraco
essa mulher
que faz
defende e para
um ato
obsceno
de violência
contra um
homem
comum
não é uma alma
comum
essa mulher
de
fato


II

nos cabelos de Magda
bem lavados
com água
benta
dos rios que
conheci
das horas que
convivi
acontecem
esses
olhos
de vidro
espiarem
belezas
que com os
olhos
dela
reconheci

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"... e se isso já é um jeito de alienar-se do mundo é porque é isso mesmo. 

e porque, talvez, nos falte instantes desse tipo bastante especial de alienação, 
quando as esquinas da vida pesam tão pouco frente a maravilhosa sensação 
de apagá-las com os devaneios construídos pela poesia. 
a beleza salvará o mundo, alguém já andou dizendo por aí."

dias de poesia
e arte
em que quero
me alienar até
a tampa

com Chico Carvalho

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brincar de oceano
para entender
os rios
que
deságuam
em mim

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tônus para trazer à tona as mentiras necessárias as verdades inconvenientes e algumas engrenagens que tornam a vida cotidianamente possível e suportável se a verdade liberta se a mentira é vital se acreditar é apenas mais um outro exercício da imaginação são coisas sem resposta por dentro:
"eis o terrível de tudo: não sei o que devo pensar ou qual mentira acreditar, e jamais saberei" /ibsen
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tremores 

cada globo ocular 
desajeita desalentos 
o olho raivoso do furacão 
deslágrimas lástimas 
em dores próximas ao cóccix 
vejo que estou diante 
da minha própria encenação 
sem alardes 
os olhos falsificam órbitas

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ou me arrepia até a alma ou não toque em nada
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ampulheta
ampunheta
ato de amputar
o tempo


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hiperespaços*

entre o que se sente e o que se vê
todo poema é uma forma de diferença
estrata
gema
exato
se digo: amor
não é amor que simplesmente digo
estou dizendo outra coisa
uma vasta e terrível metáfora
e não este sentimento
imponderável
amor dito assim num poema nunca é amor mesmo
é sempre outra coisa.
então quando escrevo qualquer coisa
qualquer amor
me vem à tona
por menor que seja o entorno
parte de um ritual
de signos onde tudo são sentidos emaranhados
ensaios
que cada leitor vasculha e encontra aqueles
que melhor se adequam a si mesmo
sentimentos
acoplados
à determinados momentos de suas vidas
toda a vida é vasta
assim como um poema: múltiplas leituras
múltiplos
amores


*releitura do poema de Sérgio Villa Matta

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