quarta-feira, 24 de junho de 2015

dos devorados...

.
"transgrida
           sua
linearidade"
Roberta Lahmeyer
.



























ouvi recentemente sobre certa erva 
que viceja os pensamentos 
os meus vicejam
de outra maneira 
vicejam na poeira 
do passado
do vigor do já lido 
do descabido
do sentido e do sem sentido 
no alarido 
do que me aflige e rege 
nas vísceras
arrancadas
regadas pelo cotidiano
mas com muito mais vigor 
pelo calor despertado
seria talvez 
a necessidade de uma escolha? 
entre o calor da raiz 
e o que foi
arrancado?

Sergio Sanches e Julio Carvalho
.................................................................................................

tudo o que foi quase 
um poema 
veio com vontades 
e talvez seja essa febre interior
que me faz
corrigir com lágrimas 
a posição das rimas
.................................................................................................

"Um antropólogo propôs uma brincadeira para algumas crianças de uma tribo africana. 
Colocou um cesto de frutas perto de uma árvore e falou que quem chegasse primeiro ficaria com elas.
Quando ele deu o sinal todas as crianças deram as mãos e correram juntas, chegando ao local elas sentaram e compartilharam as frutas entre si!!!
Quando perguntaram às crianças porque quiseram correr todas juntas quando apenas um poderia chegar e ganhar o prêmio, elas responderam: 
UBUNTU: como pode um ser feliz enquanto todos os outros estão tristes????
UBUNTU na cultura africana sub-sahariana quer dizer: “EU SOU,PORQUE NÓS SOMOS”
.................................................................................................


warhol
















mas quando escrevo
cuido da palavra
que habita
o coração 
e se desloca 
do repouso à boca
a fogueira só tem fogo
quando queima
com vontade
e as faíscas sobem
do repouso à noite
na madeira úmida 
o fogo não espalha
na palavra seca
colocada na sombra 
não tem poesia
e o coração falha
.................................................................................................

o ódio 
do pão 
entorpecido
de cada
dia
.................................................................................................

conheço o jeito certo 
de fazer errado
conheço de memória 
o que não me interessa
conheço pelo som
o que não faz sentido
conheço tudo 
até o meio do caminho 
sei até onde vou
depois dali não passo
conheço com frequência 
o que não acontece nunca
conheço pontualmente
a falta de horário 
conheço e recomeço 
e logo mais esqueço 
pois tudo o que aprendo
está do lado avesso
.................................................................................................

o princípio 
da certeza 
foi também um dia
a indecisão
.................................................................................................

sem essas meias verdades
dentro dos sapatos 
desescrevem
a sola
que ele não pisa
porque lhe falta
tudo
se alguém o visse agora
estaria descalço 
pisando no carvão 
incendiado 
depois 
da
fogueira
única 
coisa
nua
é o fogo 
que o contém
.................................................................................................























poesia
pra mim é cortar
o cabelo 
e depois de grande 
cortar de novo
sem dó 
até o calvo
poesia é descalço 
descabelado
descartado de fios
e palavras
.................................................................................................

vaga
é uma coisa 
que não tem lugar
um espaço 
em branco
disputado
em cada
palavra
não há vagas
em lábios 
e almas
paradas
.................................................................................................


seja agora
a desconstrução da ansiedade
dedos. longos. unhas roídas
(estou só a brincar com o tempo)
os dedos resumem a raiva que sinto
e o tempo é essa coisa agarrada 
debaixo das unhas
.................................................................................................

boca aberta 
e o rugir monótono da consciência
a língua míngua no pensamento
que não para de rir
então por favor
mande para qualquer lugar
esse congresso inútil de salmos
.................................................................................................

dentro do livro 
cujo título era 
DEVORA

irônicos esses livros em branco
devora palavra com tanto espaço vazio
o meio devora o corpo
o branco devora o corpo
a palavra permanece quieta
enquanto o livro
em branco
devora
.................................................................................................

"todos me acham que sofro de miséria
faço de cada história um reboliço.
mas devagar essa cicatriz banal eu escrevo;
esse ardil de loucos é um poemário;
um documento daquelas minhas dores.
tudo vai mal, dizem. tudo vai !
vai a raiva tão simples como fazer perguntas;
vai de passada qualquer maluco palpitando
                                                    [muita gente;
e vão outros palpitando os relógios
                                                  [automáticos:
...tic-tac tic-tac tic-tac...
os tique-taques nascem das nossas bocas.
bocas dissolvidas. noites volêmicas..
os sentidos moídos na rua dos atritos."
psiquiatria II - João Tala
.................................................................................................

nasceu em mim uma fonte
que nada sabia dessa água
até encontrar a margem desses poemas
que quiseram impor limites
mas as águas violaram
as margens
porque verdadeiros poemas
dispensam limites
e jogam constantemente
suas muitas e muitas palavras
para que cheguem até muito longe
e ultrapassem os mares
.................................................................................................

"de sobras de esquecimento
e flocos de desassossego
se tece a rede da memória
enquanto de retalhos de luz
e de cacos de verdades e mentiras
se constroem mitos"

Arlindo Barbeitos
.................................................................................................

há um discurso de facas
na fronteira deste poema
línguas de fogo
economizam rimas
deslizam águas
lapidando pedras
no duro frágil
coração do poeta
....

Nenhum comentário: