terça-feira, 27 de dezembro de 2016

das profundezas...

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"talvez criar
não seja nada mais
do que lembrar profundamente " . 

#Rilke

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assalto
repito: VIDA
meus dentes entranharam
no som da palavra
na ponte
atravessada
fino falo
na garganta
a vida
a vida
a verdadeira
vida
não vale um cascalho
destas avenidas

bem um buraco 
que me caiba
uma bala
exato o corpo
quebrado 
atravessado
ex
flecha
poderia
ser
cupido
ao
invés
de
tiro



remixado de João Pedro Liossi

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amores
lançados
ao
espaço
como
planetas
desgarrados
sem órbita
/
descaradamente
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vem Gregório
de Matos
desarmado
o amor
é incêndio em mares de água disfarçado
ou um rio de neve em fogo convertido
/
simples
e objetivo

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o que é amar? 
ponha no Google... 
você vai descobrir vários amores
essa é a alegria do amor comum 
descrever vários amores
várias formas de amar
o prazer de catalogar
amor de verdade
é fora de catálogo
daqueles que não respiram
não tem fôlego
um mar tão grande
que quem se afoga
volta

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essa vontade de amar
até que um outro corpo siga o meu
até o ser e o ter serem um jogo arriscado
entre olhos desavisados
seguindo
fora de um clichê
abandonado
à própria sorte
de um estar em si
inacabado
arrisca-se o amor
em giz
sobre água
essa vontade de se transformar
em um elemento que tenha
só sangue e
diamante
/
ou
dinamite
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"Cuidado, poeta: o tempo engorda a alma.
Depois de um certo número de páginas
anjos não pousam mais nas entrelinhas.
E até a lucidez, essa moderna,
também se gasta, como qualquer moeda.
O ter o que dizer é jogo arriscado,
não se resolve com um só lance de dados.
Não basta a precisão do gesto apenas.
O gesto mais felino é quase nada
sem o lastro da existência, essa cansada,
com sua textura por demais espessa
pra traspassar a tímida peneira
da pálida poesia, essa antiga.
O tempo é escasso. O dicionário é gordo.
Cuidado: Todo silêncio é pouco."
Cuidado Poeta - Paulo Henriques Britto

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"minhas mãos 
são válvulas de escape
sempre prontas"

João Pedro Liossi

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um poema existe fora dos limites:
quantos poemas podem
durar, dourar o vácuo
das estradas?"

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encaro agora uma nuvem
que apesar de cinza e pesada
não desaba
 encarar cada coisa agora
como quem pesca no escuro
e se ausenta da sala
como quem coloca o corpo inteiro
nessas salivas
poucas
e
raras


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não lembrar é ausentar 
do poema e da gente mesmo
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"acender um cigarro na
brasa de seu barulho
e derreter eu e você
nas cinzas dessa cidade"

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um poema
nos limites dos galhos
esticados
sobre minha cabeça
/
em algum lugar
chove como uma criança
entre o soluço e a palavra
o passo confiante
no delicado
úmido das pedras



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calor
o suor sob o sol [absurdo]
dos dias quentes sob que
ponte impossível a falta
de chuva
me embaça
os olhos?
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volta
ao redor
pesam
os pêsames mínimos
num ritmo ruim
arrumam a mesa
arrumam os lábios
todos os ofícios
plantam algodões
em cada orifício
sustentando
levezas
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dormir para atravessar a tarde
o monolito amarelo
uma ponte
ainda que estreita
é uma ponte
ainda que falte
uma ponte
ainda uma causa
mas questões trucidam o sono
a cara crua
a máscara nua tropeça e cai
penso em pelo menos duas maneiras de fazer o poema:
moldá-lo
elefântico
imenso
indomável
quase táctil
ou escrevê-lo
apenas
sem dó?

reindexado de João Pedro Liossi

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somos íntimos e não sabemos
somos ínfimos e não sabemos
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a noite, um búfalo negro, mais uma vez nos atropela as palavras e as vistas. o último licor de amarelo, alguém o percebe? queria beber contigo, de novo, um copo de vodka, uma sexta, o calendário. sento na cama, reoriento o tato órfão das vistas, sozinho, enquanto lembro dos nossos gostos antigos e dedos passeiam sobre a vegetação rasteira do meu cabelo

remasterizado de João Pedro Liossi

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"penso em sua lírica e em seu deslize, em como os musgos desta casa te derrubaram a boca. a revista de setembro, ainda no plástico, envelhece sobre o cesto de roupas sujas. aquele velho navio, a tempestade encharcando o tempo, inchando o intervalo dos corpos, dois, quatro, quantos dias se passaram?"

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"organizar
o organismo
a partir da
DESORDEM"

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"se eu soubesse dizer a palavra
certa, se existisse essa palavra
(a palavra certa desabou
junto com a última ilusão)

certamente eu colaria à língua
o fogo desse gelo, essa pedra
que respira longe de nós, homens,
e diria sobre o céu de agosto
de uma certa noite que pousou
dentro dos teus olhos de tristeza,
diria e o dizer seria como
um soco, um gargalhada, um vento,
uma palavra cheia, um poço,
um abraço, um beijo no teu rosto"
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"fim de dezembro
parto de mim
comigo dentro"


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