terça-feira, 11 de agosto de 2015

das digitalizações...

.
"e tenho só este sol
que me queima a língua;
e tenho só esta sede inflamável
misturada ao sangue
.............

estou contaminado de esquinas"

.............

Salgado Maranhão 

- "Viajor"
In "Chão de mitos"
.



























..............................................................


todo poema 
precisa de ponte pronta
para atravessar
nem que seja hífen 
- travessão 
pra aguentar
o disco-poema
nem tem mais vinil
suficiente
tem que ser
ponte de safena
digital















..............................................................


memória dos dentes 
enfeitiçados 
na boca
bruxismo
não por feitiçaria 
mas por nervosismo 
esses buracos
tem a profundidade
das perdas
e o corpo pede
resgate
..............................................................

labirintimidades
que desconheço 
só descubro
lambendo
..............................................................

desamor:
tu és um céu que não chove
e eu aqui embaixo
terra seca
esperando
raios
que te carreguem
..............................................................

amor geográfico

ao cabo 
de toda boa esperança 
vai-se o amor
porque vezes 
acontece
amor
curva de rio
ou amor
curva de mar
enrosca
ou incomoda
até chegar

..............................................................


















o que você espera de outra pessoa? 
cumplicidade e/ou alento
bom sexo nas horas práticas e
bom senso nas horas vagas
..............................................................

o amor
é essa serpente
que a maçã 
impossibilitou:
eva
vítima 
da culpa do fruto
adão 
pobre coitado
de tesão 
mordeu
a parte que era a casca
vermelha
do desejo
..............................................................

somos
esses pequenos 
rumos
(e átomos)
sem nenhum
atalho
..............................................................

a farpa de madeira
o arame farpado
a planta espinhenta
era a frente da casa
e sempre a cadeira
de plástico na porta
de entrada
aquela coisa kitsch
montava a paisagem
estranha na frente 
da casa
de paredes
cor
de
rosa
e chapiscos de pedras
pequenas
que se dê um tombo
ralava o joelho
e das escadas escapou
um triciclo antigo
e essa marca na cabeça 
lembrando
a pancada
e algum desarranjo
arrastado até hoje
beirando as escadas
..............................................................

a noite se desdiz
e se estende
e me dissolve
então eu me distraio
interditado 
travado com as reticências 
das palavras
pontos a observar
numa costura amarga 
numa pele frágil 
à luz de lâmpada de neon
azul
azul
azul
a linha azul sem rumo
o prumo da pele procurando
o encaixe
quer ficar só 
quer fixar só 
entre a cama e a parede 
e uma sede estranha
de companhia
sem a mínima vontade de
compartilhar
um beijo de cinema
que fosse 
é essa coisa da noite
que não é tão ruim
não é não 
ela acaba quando amanhece
tem dias que me parecem
exatamente essas noites
que nunca me inspiram
nem deixam saudades
que é retalho de cortina
que não cobre janela
..............................................................











ter todos os poros nas mãos 
e não saber porque
contém tanto
sangue
e vinte dedos equilibrados 
na corda bamba
dos dias
365 esperanças 
e algumas datas de férias 
feriados prolongados e domingos
de beira
beirando solidão misturada
com poesia
deixando os dias menos
calados
onde poemas são essas bocas
e linguas das mais distantes
babel dissonante entre aspas
e os meses de trinta 
trinta e um dias a mais
para aumentar as contas
na vida contada em minúsculas horas
e esses anos distantes
plantados
no futuro

que a Terra seja fértil
..............................................................











..............................................................

um sabre
para extirpar
esse continente
emocional
que habita
em 
mim
..............................................................

dizem 50
mas sou metade ou menos
não me acostumo 
a ser um velho em formação 
o espírito reclama
com propriedade 
porque a curiosidade
essa eterna criança 
que mora 
dentro/fora
e me agita
com seus muitos olhos
arregalados
não me deixa esquecer
que essa alma
que contém esse corpo
nunca tem calma
porque 
nova ou velha
reclama
da vida
que tem 
veio/foi/vai
ser









..............................................................

me incomoda
não ver
a dor 
a pílula 
no pequeno
quarto
de paredes sujas
se dizem sujas
mas mal as vejo
incomoda
a sujeira e dor
que não alcanço 
mais ainda
a que não vejo
..............................................................

lâmina e pétala 
corta-enfeita
sem o corte
a flor
imóvel
..............................................................

a lama com que me sujo 
e safo
pertence a esse mundo
sórdido 
que não participo ou lido
mas leio e sinto e me deparo
com telas que insistem 
no mal
novela crime violência 
que são coisas populares
entram avançam nos lares
como objetos vulgares
de adoração perene
até onde se sabe
isso é a rotina do povo
que além de oprimido
pobre
tem a informação 
vestida
com os olhos
da ignorância
..............................................................

a relva
é a renda da manhã 
e o orvalho
pra quem se lembra
é o caminho de mesa
do 
sol
..............................................................

eu me desconheço 
vezes em que não me ouço 
sou legenda
de filme 
mudo
..............................................................

o poema é a ereção da palavra
..............................................................

a fome está na mesa
ela está no meio de nós 
a fome é a sobra do homem
aquele coitado 
que nem fala 
de tanto sono
porque o sono 
espanta 
fome
como analgésico 
espanta
dor
a fome é a boca do inferno
vazia
só o pecado da carne assando
ou o churrasco grelhado
ou asas paradas de frango
até mesmo salada
resolvem
a fome acaba
muitas vezes na porta
do 
céu 
num prato
à luz de velas
na última ceia
..............................................................



























um bom
dia
atravessado
pela
sombra
.


Nenhum comentário: